[Entrevista] Especialista em Comunicação Não Violenta conta como sua prática liberta as pessoas

A Comunicação Não Violenta visa à construção de relacionamentos mais autênticos, honestos e transparentes. Isso significa que podemos iniciar uma conversa transformando nossas intenções iniciais com o objetivo de criar uma “conexão” com o outro, ou seja, de uma forma mais leve e “desarmada”, sem uma fala ofensiva ou defensiva. Confira a seguir detalhes da entrevista concedida pela psicóloga à Faculdade Phorte.

Quando e como foi o seu primeiro contato com a abordagem do Marshall Rosenberg?

Alessandra Hetch: Se não me falha a memória, foi em 2013, no colégio Rudolf Steiner. As minhas filhas estudavam lá na época, e houve uma palestra com o Sven Fröhlich, ele é um mediador de CNV. Eu fiquei bem encantada! O assunto me tocou mesmo, e aí eu fui atrás de cursos, de participar de um workshop que aconteceu no próprio colégio e me movimentei para adquirir mais conhecimentos!

Na sua vida, quais as experiências mais marcantes que foram refletidas através da abordagem da CNV?

Alessandra Hetch: Aplicar a CNV é sempre um exercício reflexivo que exige realmente parar, observar a si mesmo e identificar os sentimentos que levaram às reações x ou y. Questões familiares que antes eram mais conflitantes diminuíram bem, melhorando a qualidade das relações.  Profissionalmente, me recordo de uma pessoa que atendi que chegou atrasada ao consultório. Como é de costume, eu envio uma mensagem após 15 minutos de atraso. Quando essa pessoa chegou, gritou comigo dizendo que era um absurdo eu tratá-la como criança e que não mais voltaria. Foi tenso porque ela gritava comigo na porta do consultório, na época era localizado em uma casa. Eu disse que estava assustada com a reação dela e que gostaria de entender melhor o motivo de ela estar gritando e pedi que entrasse. Hoje, analisando, meu sentimento não era somente de susto (risos), era de exposição e de vergonha. Acolhendo e aplicando a CNV, mantivemos o processo terapêutico (risos).

Ao aplicar a Comunicação Não Violenta em sua rotina, quais as primeiras mudanças que a pessoa pode sentir em si mesma? E no social, as impressões costumam ser mais positivas ou as pessoas tendem a ter certa resistência?

Alessandra Hetch: Num primeiro momento, a sensação é a de exposição. Não estamos acostumados a falar às claras. Não por sermos falsos, mas por agirmos, ou melhor, reagirmos. Difícil parar, olhar e identificar… Exige presença, consciência, e, como diz um amigo meu, excesso de consciência cansa. Pensa na seguinte imagem: palavras são como flechas. Quando alguém diz algo, você pode desprezar ou, ainda, enfiar mais adentro no peito. Que tal pegar nas mãos e ver se ela diz algo para você, não sobre o outro, mas sobre si mesmo? Aí entram as reações mais comuns no trato com os outros: culpa e vitimização. Passada a sensação de exposição, dá um alívio danado colocar para o outro de forma não agressiva. É uma sensação de liberdade, como se apropriar/responsabilizar pelo que sente sem drama, mas com gentileza ou autocompaixão (de forma positiva, não me refiro à culpa).

Qual a importância da Comunicação Não Violenta quando pensamos na grande porcentagem de casos psicológicos, como depressão, ansiedade, síndrome de pânico etc.?

Alessandra Hetch: Em relação ao social, pessoas mais egocêntricas nem percebem a mudança. As que gostam de discutir, “causar”, ficam com mais raiva (risos). Outras aproveitam a oportunidade para se abrir já que nessa postura /prática da CNV. O bacana é deixar de lado os julgamentos, e isso é libertador.

Saber o que a gente sente, identificar, acho que é o primeiro passo, validar isso. “Ah, mas o outro vai achar isso ou aquilo”, não. Valida sem se sentir um coitado, sem culpar o outro, mas reconhece aquilo que está pegando em si mesmo. Acho que isso é extremamente importante, verificar a necessidade que está por detrás. Porque se a gente não faz isso, a gente vai atirando às cegas e acaba sendo incompreendido.

Acho que é de fundamental importância, e acho que só vem a agregar ao tratamento seja da síndrome do pânico, da depressão, da ansiedade… Acho que ampliar a autoconsciência e perceber as reações, com qual lente a gente está reagindo. Mas acho que a palavra de ordem é também poder enxergar as coisas por um outro ângulo.

A CNV não cura as doenças, mas certamente cria-se um canal de empatia, de autocompaixão, de ser seu melhor amigo, e esse autoapoio é muito importante na aderência a qualquer tratamento. Acho que é um dos primeiros passos para a melhora da autoestima, para se olhar no espelho e dizer “então eu tô aqui” e se reconhecer como uma pessoa que sente, que sofre, e que precisa de cuidado, mas precisa se autocuidar também!

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